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Mariana Belmont

O racismo precisa urgentemente ser a pauta principal das pessoas brancas

ECOA

28/11/2019 04h00

Logo na escola pública eu aprendi que não existia isso de "somos todos iguais". Talvez essa frase seja uma das maiores ciladas que podemos cair na escola ou em casa. Não, não somos todos iguais diante das desigualdades que nos gritam todos os dias, em todos os lugares. Se fosse assim, não teríamos todos os dias casos de discriminação racial nos ambientes corporativos, nos espaços públicos, nas casas legislativas e nos mais variados espaços da cidade. Então, não, não somos todos iguais. E aqui no Brasil é até possível reconhecermos que existe um ou outro tipo de discriminação, mas ela é sempre um problema do "outro".

Foi na aula de história e em casa que ouvi falar sobre racismo. Mas, na verdade, foi depois de perder três amigos negros, num período de dois meses, assassinados pela polícia na porta da escola, que eu entendi a quem a bala se direcionava. Então ouvir meus amigos e ler sobre isso foi sempre muito importante para mim. Mas ainda não era a prioridade. Ainda.

Eu, uma mulher periférica e branca, só me descobri branca muito tempo depois da escola, depois da universidade, foi só nos meus primeiros meses trabalhando no Cedeca (Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente) Interlagos que comecei a entender, de fato, a importância de que, além de trabalhar com direitos humanos, era necessário falar sobre racismo e combatê-lo urgentemente. E foi exatamente em uma reunião do Comitê Contra o Genocídio da População Negra, ouvindo o Douglas Belchior e lendo constantemente o blog dele na Carta Capital, que eu aprendi sobre a história do Brasil.

Escrever sobre o tema é um exercício importante e, como mulher branca, me colocar a serviço das lutas de combate ao racismo, entendendo que a questão racial não é recorte; ela é centralidade para entendermos toda a desigualdade social, a construção das cidades, o genocídio cada vez mais gritante nas periferias que matam centenas de jovens negros e todo o acesso a direitos.

Por isso a branquitude acrítica é um problema e ela ainda precisa, com muita urgência, ser entendida e debatida pelas pessoas brancas. Só assim, reconhecendo privilégios e falando sobre eles, pode ser possível entendermos que não basta usar a frase "não sou racista". Isso é pouco, precisa de fato fazer a diferença na luta contra a desigualdade racial. O UOL produziu um texto que acho bem necessário para ler sobre a branquitude.

Saí há quase um ano de um trabalho em uma organização branca e classe média, para colaborar na construção da incidência política dentro da Uneafro Brasil, e, na sequência, acompanhar o nascimento da importante articulação que é a Coalizão Negra Por Direitos. Tenho descoberto, então, meu lugar de construção como pessoa branca nas estratégias dentro da política institucional para o combate ao racismo no país. E aprender, antes de qualquer coisa, que o movimento negro brasileiro é protagonista fundamental de vários avanços e direitos no país.

Hoje percebo e provoco cada vez mais que é tarefa de todas as organizações entender que a questão racial é centralidade para qualquer debate, construção de política pública e pesquisas. É uma tarefa não mais apoiar a história racista das elites brasileiras em negar a vida e a dignidade ao povo negro. E reconhecer a importância do movimento negro brasileiro em toda a construção histórica da democracia neste país.

Te convido para ler e ouvir os movimentos negros do Brasil, Estados Unidos, Equador, Colômbia e África do Sul em um Encontro em São Paulo, que começa nesta sexta-feira, 29 de novembro, ainda dentro do mês da Consciência Negra.

 O que é a Coalizão Negra Por Direitos

A Coalizão Negra por Direitos é uma articulação de mais de 100 organizações do movimento negro no Brasil que, desde o início deste ano, tem promovido ações conjuntas para influenciar o legislativo no nível federal com vistas a assegurar os direitos humanos da população negra no Brasil. Além das ações de incidência política nacional, a Coalizão tem articulado apoio internacional e feito denúncias em organismos de direitos humanos e fóruns internacionais.

Sobre a Autora

Nascida em Colônia, extremo sul da cidade de São Paulo, Mariana Belmont se define como uma esticadora de pontes. Atuando com mobilização e comunicação para políticas públicas, faz parte da Rede Jornalistas das Periferias, constrói o Ocupa Política e colabora com a Uneafro Brasil.

Sobre o Blog

Cidades que são florestas, florestas que são cidades, mudanças climáticas e conexões para viver melhor. Semanalmente, Mariana Belmont pensa sobre o que tudo isso tem a ver com a gente, e explica melhor essa história de meio ambiente sermos todas e todos nós juntos no mundo.